terça-feira, 16 de dezembro de 2008

Morde me os olhos



Entra de repente. Como um vagabundo que se esgueira, sorrateiramente, no escuro, e nos rouba tudo. A força, o sorriso, o dia seguinte. Já não há mais segredos. O brilho foi ofuscado, aos poucos, pelas luzes de natal, espalhadas pelas ruas. Os meus instintos de resistência estão reduzidos a pó. Restam apenas os mais primitivos, que me guiam, mecanicamente, pelas horas infinitas.
O perto parece longe, e o caminho esta cheio de emboscadas. É o cheiro, é o sorriso de alguém idêntico a um de mim, é uma força de quatro patas. É tudo. É ate a buzina de um carro. É uma viagem ate vos, e um regresso doloroso ate mim.
Fecho os olhos, com muita força, ate me doerem. Desejo que alguém os morda, para ser uma dor ainda mais real. Desejo vos como em criança desejava ser uma grande mulher, rica e feliz. Desejo vos como não desejo nada, ninguém.
Não é real.
Abro os olhos. Não doeu nada. Fecho os novamente.
Só voltarei a abri-los quando me sentir no meu ninho.
Já não falta tudo, mas falta o infinito

Di*

sábado, 6 de dezembro de 2008

Cinzas de um sono

Tentei espreitar. Estava tudo desfocado. Talvez fosse do arame farpado. Afastei-o com a mao direita. Piquei-me. Uma gota de sangue caiu.
Nao senti dor.
Voltei os olhos e deparei me com uma imensidao de terra.
Ouvi gritos silenciosos. senti lagrimas secas a formar aquela maldita lama. percorri cada olhar invisivel que deambulava por entre os fornos de queimar pessoas. senti cada um destes olhares cravados nas minhas costas, na minha alma.
sabia tudo dali, sentia tudo ali. ou pelo menos, fingi saber. A indiferença estava-me a matar, bem devagar.
senti me a sufocar no meio de duas mil toneladas de cabelo humano. tentei abrir os olhos, mas continuavam a minha frente, barracoes para animais, onde um dia viveram ,(ironia), milhares de restos vivos de pessoas; cobertos pelo seu proprio excremento. capa contra o frio, dizem eles, capa contra a dor, digo eu.
sao eles que fazem daqueles hectares, uma terra abençoada pela maldiçao do seu destino.
foi dia 1 de dezembro.
finalmente regressei do sono. um sono real. aquele foi o meu ( egoismo) pesadelo real.
chamam-lhe Auschwitz.
Eu chamo-lhe historia. Historia daquela que marca o corpo e a alma, como o gado é marcado com ferro a arder.
carrego a sua marca ate que me esqueça dela.
quando me esquecer, voltarei ao "sono" e serei marcada novamente.
Farei por isso.


di*